Crítica // O Azarão, trilogia Irmãos Wolfe de Markus Zusac

by - julho 04, 2018


"Minha mãe fala pouco, mas é a mais corajosa na nossa casa." — Cameron || O Azarão de Markus Zusac


 Sinopse: Antes de tornar-se mundialmente conhecido, Markus Zusak escreveu uma trilogia de sucesso que somente agora está sendo publicada no Brasil. O primeiro título chama-se O Azarão. Fãs de A menina que roubava livros não podem deixar de ler os romances que inciaram a carreira estelar desse autor. Narrado em primeira pessoa, o livro apresenta a história de Cameron Wolfe, um garoto de 15 anos, perdido na vida e que vive às turras com a família. Trabalha com o pai encanador e sua mãe está sempre brigando com os filhos, na pequena casa onde todos moram juntos. Steve é o mais velho e mais bem-sucedido. Sarah é a segunda, e está sempre dando uns amassos com o namorado. Rube é o terceiro e o mais próximo de Cameron. Os dois, além de boxeadores amadores, vivem armando esquemas para roubar lojas e outros locais do tipo. Contudo, os planos nunca saem do papel. Uma história sobre a vida e sobre as lições que dela podem ser tiradas. Um romance de formação que exibe um jovem incorrigível, infeliz consigo mesmo e com sua vida. - "Tento ser humano em minha escrita. Comecei a escrever porque era o caminho natural. Durante o ensino médio eu era muito introvertido. Sempre tinha histórias na cabeça. Então comecei a escrevê-las." - Markus Zusak ||Título Original: The Underdogs #1 || Autor: Markus Zusac || Pág. 175 || Editora: Bertrand Brasil || Ano: 2012 ||
ISBN-10:
ISBN-10: 8528616436 || Gênero: Romance, Infato Juvenil || Skoob // Comprar Amazon //


por Jéssica Faustino


              Temos quatro irmãos: Steve o mais velho, já empregado, se da bem no futebol e com as garotas e aparentemente é o membro que recebe os aplausos da família; Sarah, a segunda mais velha e a irmã que fica sentada no sofá beijando o namorado; em seguida temos Rube, o cara que gosta de se exibir e parceiro de encrencas do Cameron, o caçula da família. Este perdeu o emprego, está no colegial e não se dá bem com as garotas. Dos quatro quem narra tudo para o leitor é Cameron, o mais novo. Ele e Rube estão naquela fase que quase todo mundo já passou onde se sonha em fazer alguma coisa usando um taco de basebol, mas que não seja jogar basebol. No caso deles é um assalto. Mas esse não é o primeiro que estão planejando, e segundo Cameron também não será o primeiro a se tornar um plano esquecido.

              Aparentemente o livro tem um foco no público mais novo, entre 14 e 16 anos. No entanto eu já tenho 19 e para mim foi uma experiência muito bacana. Já passei pelos mesmos sentimentos que eles e estou chegando na fase dos irmãos mais velhos, então foi muito interessante ver o autor trabalhando a vida e o modo de enxergar tudo ao nosso redor, de quatro jovens em idades distintas, pelos olhos do mais novo, Cameron. Podemos ver como nessa idade tudo que acontece dentro de casa se reflete em nossa vida. Lendo "O Azarão" lembrei-me de coisas que já tive medo e que desejei quando mais nova, mas hoje eu consigo rir delas. Não será diferente agora. Então é bom lembrar que tudo passa, o importante é absorver as lições.

              O autor do livro é Markus Zusac, o mesmo que escreveu "A Menina que Roubava Livros". Mas em "O Azarão" é possível que você não ache algo fantástico e que te faça reagir com "woooo", logo de cara, mas Markus consegue deixar um gancho nos momentos menos esperados e isso sim vai te fazer continuar a leitura. Li alguns comentários de que este é um livro raso, com personagens e romance pouco trabalhado, mas acredito que se as pessoas prestassem mais atenção ao contexto em que a história está sendo criada elas não difamariam um livro assim. "O Azarão" escrito por Markus Zusac não é sobre um romance de suspirar ou sobre personagens secundários, mas sobre os dilemas e as crises de personalidade que sofremos na adolescência sendo contadas por um garoto de 15 anos!

              Me digam se estou enganada, mas, eu li poucos autores masculinos (o que me faz questionar o porque de algumas pessoas acharam que não se leem muitas mulheres atualmente. talvez os meus gêneros favoritos as favoreçam), mas em todos eles notei que os escritores não se demoram muito em determinadas cenas e descrições de ambientes e roupas. Nesse livro não é diferente. Se ele fosse um filme seria daqueles filmados em vários cortes, um atrás do outro. Isso é uma observação positiva, já que Markus Zusac só narra ações importantes para o desenrolar da história e do que aconteceu durante o inverno e o verão do Cameron e sua família. Com isso eu não quero dizer que o livro é extremamente rápido e sem caprichos. Não. Quer dizer apenas que o autor não tira o foco sobre o que ele escreve.

Uma coisa curiosa na escrita masculina é que eles parecem sempre colocar situações que fazem o leitor suspeitar se de fato tais coisas já aconteceram com eles (os autores). Chuck em Clube da Luta, John Green e seus trezentos personagens complexos e agora Markus em O Azarão. Isso é bom. Claro que não é uma certeza, mas são situações e pensamentos tão sentimentais e realistas que me parecem impossíveis de não ser um pensamento desenvolvido pelo autor. Acho isso muito profundo. Expressar-se nas páginas o que aparentemente você não falaria a outras pessoas em um dia qualquer. Por outro lado é algo delicado, comparar pensamentos do autor com a personalidade do seu personagem. O que vocês acham?

              Talvez, quando eu digo "um livro para explodir a cabeça" você imagine um calhamaço de ficção científica, mas não. "O Azarão" é um livro que conta os acontecimentos de certa temporada da vida do Cameron, um adolescente de apenas quinze anos, narrando alguns dos dias que lhe pareceram mais importantes; os seus pensamentos e comportamentos; e a situação da sua família pelos seus próprios olhos. Ao mesmo tempo em que parece que o mesmo está falando de coisas tão comuns e simples ou até mesmo sem sentido, você consegue enxergar as metáforas por trás de tudo. Talvez tenha sido isso que foi capaz de atirar crises existenciais pra todo lado, incluindo o seu comportamento dentro do primeiro grupo social que nós participamos ao nascer, e também no reflexo da sociedade em nós e vice versa. A gente cresce, vai ficando cego e as vezes esquece que com quatorze, quinze anos nós já entendemos e percebemos muitas coisas acontecendo dentro de nossa casa.

"Me sentia ansioso, sujo, doente, só por ser eu. Qual era o problema comigo? Me sentia como o cachorro que tem raiva no livro que estava lendo para a escola, O Sol é Para Todos." — Cameron (O Azarão)
Por ser tão jovem os pensamentos de Cameron chegam a ser preocupantes para mim. É como se por um momento, a medida que vamos envelhecendo, esquecemos que nessa idade os adolescentes já conseguem notar todo o clima quebrado e sentimentos reprimidos que habitam na família. Não sou muito mais velha que ele, mas eu havia esquecido e quando lembrei-me foi bem tocante. Também é um tanto assustador! A forma como Markus Zusac aborda a solidão na adolescência, os elos que se quebram com o tempo dentro da própria família e a certeza de que cada individuo agora possui os seus próprios problemas sendo remoídos na própria cabeça. Cameron sabe disso tudo, e o que preocupa é que ele se importa. Se importa demais com tudo o que acontece e principalmente com o que não tem acontecido em sua vida e na dos demais. Foi ai onde me lembrei que até hoje nós também somos assim. "O Azarão" é um livro ótimo por si só.


              O Azarão é o primeiro livro de uma trilogia, seguido por "Bom de Briga", sendo "A Garota Que Eu Quero" o último e também o livro mais conhecido dos três. Tenho em mim que cada leitor deve escolher com cuidado o livro que quer ler: você pode encontrar um texto simples que te emocionara por semanas, sendo capaz de mudar a sua vida, ou ler um livro de 400 páginas e achar tudo desnecessário. Então, dependendo do que você busca para ler e do quanto se entregará a história, tenho certeza que o Azarão será uma ótima escolha. Sobre minha nota, a história teve uma nota final de 4.6 e 4 para edição editorial, totalizando 8.6 de 10.0 estrelas.

"Foi aí que decidi que precisava decidir uma coisa.
Precisava decidir o que ia fazer e o que ia ser.
Estava de pé ali, esperando que alguém fizesse alguma coisa, até perceber que a pessoa que eu estava esperando era eu mesmo."

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